Actomyosin ATPase
Proteínas miofibrilares incluem as do filamento grosso (principalmente miosina) e do filamento fino (principalmente actina, troponina e tropomiosina). A miosina nativa de mamíferos é composta de duas cadeias pesadas de miosina (HC) e quatro cadeias leves de miosina (LC). As duas subunidades do HC do ventrículo de mamíferos (α, β) são combinadas em três possíveis dímeros VI (αα), V2 (αβ) e V3 (ββ), que podem ser distinguidos pela atividade enzimática (ATPase), taxas de contração e mobilidade eletroforética em géis não-dissociantes. A capacidade do coração de mamíferos de expressar diferentes isoformas de miosinas proporciona plasticidade na resposta cardíaca às mudanças nas exigências cardiovasculares. Assim, mudanças de longo prazo na função ventricular acompanhando o desenvolvimento, treinamento para exercícios ou mudanças nas demandas metabólicas (por exemplo, fome, condições hormonais) podem ser atendidas por adaptações estruturais (Solaro et al., 1989). Ao contrário da situação dos mamíferos, apenas uma isoforma de miosina nativa é detectada nos ventrículos da maioria dos teleósteos (Karasinski, 1988; Martinez et al., 1991). O ventrículo do peixe-vermelho (Carassius auratus L.) demonstra duas isoformas (Karasinski, 1988). Embora apenas uma isoforma de miosina pudesse ser detectada no ventrículo da carpa (Cyprinus carpio) (Karasinski, 1988), a actividade da miosina ATPase (μmol fosfato libertado/min/mg de miosina) do miocárdio compacto da carpa é cerca de 50% superior à do miocárdio esponjoso (Bass et al., 1973). Isto sugere a presença de pelo menos duas isoformas diferentes na atividade catalítica, que são eletroforicamente indistinguíveis usando as técnicas aplicadas até o momento. As miosinas nativas do átrio migram como uma única faixa em quatro ciprinídeos (Tinca tinca L., Rutilis rutilis L. Leuciscus leuciscus L., Gobio gobio L.; Karanski, 1988) e um salmonídeo (Salvelinus alpinus, L.; Martinez et al, 1991), mas duas bandas em três outros ciprinídeos (Cyprinus carpio L., Carassius auratus gibelio Bloch, Carassius carassius L.; Karanski, 1988). A miosina atrial nativa é distinta da do ventrículo em cada espécie (Karanski, 1988; Martinez et al., 1991).
Electroforese da miosina em condições de desnaturação revela a composição da subunidade (HC, LC). Subunidades únicas do HC são detectadas tanto no ventrículo quanto no átrio do ártico char, (Salvelinus alpinus) consistente com a expressão de apenas uma miosina nativa aparente (Martinez et al., 1991). Átrio e ventrículo possuem cada um dois tipos de cadeias leves de miosina (LC1, LC2) (Karanski, 1988; Martinez et al., 1991). Cada isoforma atrial comigra com sua contraparte ventricular em eletroforese em gel bidimensional (Martinez et al., 1991).
Alterações nas proteínas miofibrilares ocorrem em relação à temperatura de aclimatação no músculo esquelético (ver Guderley e Blier, 1988; Johnston et al., 1990). Johnston et al. (1975) demonstraram que a actividade da ATPase miofibrilar esquelética dos peixes é 2,8 vezes superior em peixes aclimatados a 1°C do que a 26°C. Também, diferenças marcantes na estabilidade térmica foram óbvias, como indicado pela inactivação a 37°C. Não foram encontradas alterações induzidas por aclimatação nos perfis esqueléticos de HC usando análise de proteínas nativas (Johnston et al., 1990). O mapeamento do peptídeo das proteínas miosinas do músculo esquelético do Cyprinus carpio produz pouco (α-chymotrypsin treated HC subfragment-1; Hwang et al., 1991) ou nenhuma diferença (V8 protease ou tratamento de quimotripsina do HC; Johnston et al., 1990)) induzido pela aclimatação a diferentes temperaturas. Um aumento na codificação do RNA mensageiro (mRNA) para a subunidade de migração rápida do HC foi detectado sob regimes semelhantes de aclimatação (Gerlach et al., 1990). As alterações miofibrilares não foram examinadas no coração, onde a aclimatação a frio em algumas espécies de peixes leva a alterações no tamanho do coração, frequência cardíaca e eficiência mecânica (e.g., Graham e Farrell, 1990). Nos mamíferos, há evidências de mudanças nas isoformas de miosina cardíaca em relação ao desenvolvimento (V3 a V1), e após o treino de natação (ver Solaro et al., 1989). Novamente, não houve estudos comparáveis em peixes.
A espinha dorsal dos filamentos finos é de cadeia F dupla, composta de monômeros de cadeia G montados em filamentos. A energia da mudança de conformação associada à montagem varia entre espécies de peixes de uma forma que sugere a adaptação da estrutura da proteína tanto à temperatura como à pressão hidrostática (Swezey e Somero, 1982). A troponina (Tn) é composta por três proteínas; TnC é a proteína de ligação do cálcio, TnI inibe a actina de se ligar às cabeças de miosina, e TnT liga a tropomiosina. O coração de mamífero possui apenas uma isoforma de TnC, compartilhada pelo músculo esquelético de troca lenta, mas distinta do músculo esquelético de troca rápida TnC (Solaro et al., 1986). Mudanças nas isoformas TnI ocorrem no desenvolvimento dos mamíferos. Essas diferenças ajudam a explicar os efeitos diferenciais da acidose na sensibilidade de Ca2+ do Tn de neonatos e ratos adultos (ver Solaro et al., 1989). As diferenças interespécies em TnC e TnI de mamíferos e aves são evidentes a partir de análises de sequência (Collins, 1991; Murphy et al., 1991), mas as diferenças fisiológicas correspondentes não foram demonstradas. Até cinco isoformas TnT foram identificadas em corações de mamíferos. Embora seus papéis funcionais não estejam bem estabelecidos, as diferentes isoformas podem afetar as atividades da ATPase (ver Solaro et al., 1989). Diferenças intra e interespecíficas nos componentes da Tn-tropomiosina cardíaca não foram demonstradas em peixes.
Isoformas de proteínas miofibrilares cardíacas em peixes não foram observadas na maioria dos estudos. A plasticidade proporcionada pelas isoformas em mamíferos é importante na resposta do coração a mudanças a longo prazo na procura cardiovascular. Os efeitos fisiológicos que levam a mudanças na expressão das isoformas nos mamíferos (fome, exercício, taxa metabólica basal, adaptação à temperatura) podem ser muito mais extremos em muitas espécies de peixes. Consequentemente, é improvável que a diversidade de isoformas miofibrilares cardíacas nos peixes seja tão limitada como sugerido pelos estudos realizados até à data. Talvez a introdução de uma maior variedade de técnicas (e.g., hibridação do mRNA; Gerlach et al., 1990) possa revelar diferenças em proteínas contráteis não identificadas actualmente usando a análise proteica convencional.